Quando gira a
maçaneta da porta
Rosângela Silva
Quando a filha (poderia ser um
filho) avisa que vai sair um frio
percorre toda minha coluna cervical e eu junto com uma imensidão de outros pais
pensamos “hoje será uma daquelas noites mal dormidas e repleta de preocupação,
sono picado, olhar preso ao celular, ligações para saber como eles estão por
horas a fio.
A preocupação invade o coração e
começamos com as boas vibrações, na certeza de que vão saber fazer boas
escolhas e cercar-se de gente boa.
O mundo que nos rodeia está
perigoso, repleto de gente egoísta, narcisista, preconceituosa e maldosa. As
drogas comprometem o bom discernimento, as bebidas dão ousadia para ações que
não aconteceriam em estado normal, a falta de respeito e empatia validam agressões.
A valentia exigida pela sociedade não aceita levar desaforos para casa. A
desvalorização das minorias permitem açoitar o outro com palavras, gestos e
atitudes despudoradas.
Dito isso, quando eles retornam
para casa sãos, salvos e cheios de aventuras para contar podemos abraçá-los e
desacelerar nossos corações preocupados.
Damos atenção às suas
experimentações e eles pouco percebem das “nossas grandes aventuras” que fazem
o coração quase sair pela boca: levar a trupe para uma festa pela estrada de terra
escorregadia com o barro da chuva que
acabava de cair a quilômetros da sua casa; ser parada por uma blits da polícia
em plena madrugada só de pijama (não vestindo as peças íntimas), pegar a pista
em plena madrugada guiada pelo GPS do celular, sair de casa às 4 e trinta da
madrugada, percorrer as ruas desertas da cidade para pegá-los eufóricos numa
festa do outro lado do mundo, receber o áudio de sua filha chorando nervosa por
ter sido deixada pela carona e ter pego um motorista da uber que a aterrorizou
junto com suas amigas, tendo que esperar horas para que chegassem sãs e salvas
pela ação da polícia.
É temos que ter um coração bem
forte, resiliente e amoroso. Por isso digo, quando gira a maçaneta da porta é
puro alívio. A filha (O filho) chegou em
casa do passeio escolhido.
Quando gira a maçaneta da porta
agradeço a Deus por ter trazido minha “eterna criança” ao aconchego do nosso
lar.
Quando gira a maçaneta da porta
pergunto se existem mães-pais que dormem despreocupadamente.
Quando gira a maçaneta da porta
abraço e beijo mentalmente minha cria, meu maior tesouro.
Quando gira a maçaneta da porta
meus medos e fantasmas dão trégua ao meu coração e à minha mente, mesmo que
momentaneamente.
Quando gira a maçaneta da porta
posso entregar-me ao sono profundo. Não sem antes, ainda permanecer alerta para
ouvir suas narrações que, mesmo caindo de sono, escolho escutar para saber mais
e mais da sua vida.
Agradeço que ela escolha me
contar das suas vivências e eu possa opinar e aconselhar ciente de que confia
em mim e aceita minhas censuras e orientações.
Agora então, boa noite e bons sonhos para todos os pais
aflitos. Semana que vem tem mais...