Rosângela Silva
Algumas imagens adormecem em nossas
memórias e são despertadas de repente quando situações da vida real a convocam.
Dia desses, visitei a casa da minha tia Maria, onde muitos objetos da minha avó
materna se encontram e sentei-me na mesa para o café da tarde. Num instante meu
olhar parou em frente à velha cristaleira e meu pensamento voou ao passado.
Cristaleiras são móveis mágicos,
encantadores. Guardam coisas de valor, taças e copos especiais, suvenires
trazidos de alguma viagem, mimos recebidos de alguém especial, miniaturas
vindas de algum lugar. Cristaleiras adornam nossa casa e nossas emoções.
Recordei então momentos da infância,
quando aqueles pequenos objetos contidos pela cristaleira, guardados nela como
preciosidades, me encantavam e me faziam mergulhar num mundo de fantasias sem
igual.
Hipnotizada
por eles, meu olhar captava um por um. Em cada objeto uma viagem fantástica. Um
jogo de café, com desenhos de flores azuis, hoje sem mais as xícaras que o
acompanhavam, feitas em cacos, ao longo do tempo. Uma jarra de suco com seis
copos com borda dourada, que eu acreditava ser desenhada realmente com ouro.
Bichinhos de louça. Muitos deles: três
gatinhos e três patinhos idênticos, galo, cachorrinhos muitos, um elefante
vermelho, um burrinho de madeira carregado de lápis de cor.
Muitas jarrinhas também de louça, copos e
xícaras de diferentes tamanhos e diversos modelos.
A cristaleira da vó Mariinha ficava na
sala de uma casa com várias quartos, cozinha grande, copa, alpendre, janelas e
portas amplas e chão assoalhado de madeira, à disposição de todos, mas
permanecia trancada sempre. Só podíamos contemplar suas maravilhas do lado de
fora, era como o fruto proibido.
Antigamente as cristaleiras simbolizavam
luxo e sofisticação. Eram símbolos de respeito e cuidado estabelecidos às
crianças. Deve ser por isso que hoje embelezam as casas dando sensação de
conforto, calor e aconchego.
Da vó Mariinha, além da recordação da
cristaleira, também é forte a lembrança das suas rezas diárias embaixo de cada
oratório e imagens sagradas que ficavam expostos em sua sala e do calor aconchegante das suas
colchas de retalhos que me acolhiam nas manhãs geladas do inverno, quando eu
despertava cedo do meu colchão de palha e corria para sua cama. Ali me
aguardavam duas ou três balas doces debaixo do travesseiro e um aconchego
caloroso, inesquecíveis.
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